Na apresentação do livro ocorrida há duas semanas na Sociedade de Geografia de Lisboa, o autor, entre outras considerações à obra e aos factos nela contida, afirmou tratar-se o presente livro de uma espécie de continuação de “A Vida num Sopro” e que, com isso, estaria a efectuar uma saga da sua família.
Assim, antes de ler “O Anjo Branco”, empreendi a releitura de “A Vida num Sopro” e em boa hora o fiz, pois as peças do puzzle encaixam-se de uma forma perfeita, sobretudo no primeiro terço de “O Anjo Branco”.
A história inicia-se precisamente algumas semanas após a morte de Luís, estando Amélia em profunda depressão sem que o seu marido soubesse como agir. Ou seja, é de facto uma continuação, pois as personagens iniciais são precisamente as mesmas, pese embora elas vão desaparecendo progressivamente, sendo substituídas por outras mas que mantém a família Branco como fio condutor, não fosse José Branco, filho de Amélia que cresce, licencia-se em medicina e parte para Moçambique para aí exercer a sua actividade em prol dos mais necessitados.
Embora o romance tenha o seu epílogo com o massacre de Wiriyamu, levado a cabo pela 6ª Companhia de comandos de Moçambique, este romance, que considero um dos mais bem conseguidos de Rodrigues dos Santos, é um romance essencialmente sobre a Guerra Colonial e a forma como os portugueses e os nativos a viram e sentiram.
Impressionou-me a extrema violência e a forma crua como o autor narra alguns acontecimentos. O próprio autor assume serem os casos amorosos puramente fictícios, os acontecimentos factuais são mesmo reais ou inspirados em coisas que realmente aconteceram, e é impressionante o que é narrado, a extrema crueldade de um conflito que, mais de 30 anos passados, ainda está por discutir na opinião pública.
Houve algo que me chamou a atenção na apresentação e que, após ler o livro, consegui compreender. Dizia o autor que, na altura em que estava a escrever o livro, quis entender a lógica do massacre, do porquê de soldados armados matarem mulher e crianças indefesas e que, inclusive, inquiriu o comandante que comandou os comandos nesse massacre, tendo o mesmo respondido que há coisas que não fazem sentido agora mas que faziam naquele contexto. Por muito forte que seja, damos connosco a perceber a lógica do massacre e a perceber que o mesmo foi feito porque, simplesmente, tinha de ser feito. E isso é uma das principais virtudes desta obra.
Numa escrita simples, sem grandes floreados e com as descrições necessárias, a história vai-se desenrolando de uma forma lenta, suave mas necessária. José Rodrigues dos Santos sabe como contar uma história, sabe interligar muito bem factos históricos com ficcionais, dando-nos uma visão da vida portuguesa que abrange 40 anos, findando num acontecimento que ainda hoje, repito, carece de explicação e discussão: A Guerra Colonial.
Há algum tempo que tenciono ler algo do autor. Estava a pensar em iniciar com "A Filha do Capitão" os policiais dele não me atraem, são demasiadamente parecidos com o D. Brown (pelo que pude apurar)
ResponderEliminarJá tenho Anjo Branco, mas não sabia que tinha de ler "A Vida num Sopro" :P vou ter de comprar :D
Abraço
Ps: a tua classificação aos livros faz falta
Olá Paula!
ResponderEliminarA Filha do Capitão, para mim, é dos melhores livros da literatura portuguesa e acho muito bem começares por aí.
Em relação aos policiais, não concordo que sejam demasiadamente parecidos com os de Dan Brown. Na minha opinião os de JRS são mais actuais e bem mais interessantes, em todo o caso, acho que devias ler o Codex, pois esse diz respeito à História de Portugal e aprende-se muito.
Em relação ao Anjo Branco e pese embora seja uma continuação da "Vida num Sopro", penso que não necessitas de ler esse primeiro. São livros independentes, com o mesmo fio condutor, é certo, mas independentes. Agora que ler o dois há coisas que fazem mais sentido e que encaixam de outra forma, disso não tenho dúvidas.
A classificação?
Tirei-a porque dei comigo a não saber que classificação dava aos livros. Classificar de 0 a 10 sempre achei que não fazia sentido, pois é uma escala muito grande. De 0 a 5 fez sentido até começar a ter dificuldade em dar um 4 ou um 3, pois entre eles as diferenças podem ser mínimas. Assim decidi tirar a classificação e deixar a cargo daqueles que lêem a opinião, ler entrelinhas a classificação que estou a dar.
Como já te disse...
ResponderEliminarNão sei quando terei a oportunidade de ler o livro.
Fico muito contente que tenhas gostado e fico ansioso por considerares um dos mais bem conseguidos!
Este senhor é magistral! Qualquer obra dele remete-nos sempre à compreensão de um tema interessantíssimo.
ResponderEliminarA ler caixas de mensagens,não consigo deixar de opinar que por acaso também já desisti de catalogar livro em classificações, seja ela alta ou baixa, já que, tantas vezes, caracteriza-se um com apenas um único adjectivo.
Descobri agora este espaço, e adorei!
Feliz 2011, de preferência com muitas e grandiosas leituras.
bjo