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terça-feira, 29 de novembro de 2011

Vidas Surpreendentes, Mortes Insólitas da História de Portugal – Ricardo Raimundo


Geralmente a História refere a vida e feitos individuais e colectivos que deram origem a acontecimentos que, obviamente, tiveram influência no percurso das sociedades e civilizações, sem que, de uma forma geral, se aborde a morte ou o fim desses indivíduos ou dessas civilizações. Geralmente são tratados de uma forma isolada e não como parte integrante da História, parecendo que a morte não faz parte integrante da vida e da evolução dessas sociedades e civilizações.

A obra presente sintetiza, de uma forma brilhante, a vida de alguns personagens que, de uma forma ou de outra, tiveram grande importância na História de Portugal. Mas o autor vai mais longe. Conforme o título deixa antever, depois de sintetizar a vida, narra a forma como esse personagem faleceu e em que condições, e é aqui que, quanto a mim, reside o fascínio desta obra.

É importante referir que o livro está dividido em três fases: Época Medieval (séculos VI-XV), Época Moderna (séculos XV-XIX) e Época Contemporânea (séculos XIX-XX), e nestas três época é interessante verificar a evolução das mentalidades das épocas em questão.

E em todas estas épocas surgem personagens fascinantes sendo, algumas delas para mim, totalmente desconhecidos. No entanto e independentemente da sua maior ou menor importância na História de Portugal, o que se assinala é que no tempo delas, foram tidas e consideradas e que a sua morte trouxe consternação e até mistérios à forma como pereceram.

Depois é muito curioso constatar a morte horrível e surreal de maior parte dos personagens referidos. Há de tudo, de mortos por ataques de leão, a morto e comido pelos canibais, homicídios ainda por explicar, suicídios encenados, envenenados, acreditem, de tudo e, geralmente, impressiona que depois de vidas tão ricas e algumas igualmente curtas, acabem de forma tão surreal e estranha.

Em suma, um livro extraordinário que me encantou. Para além de me dar a conhecer vários personagens que desconhecia, fascinou-me a forma sintética, no entanto clara e esclarecedora, como o autor narrou a vida e morte.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Deuses Enfurecidos – Renato Fontinha


Confesso que desconhecia este autor e em boa hora decidi empreender a leitura desta obra que se revelou prazeirosa e informativa.

Já tinha lido sobre os Descobrimentos, mas nunca havia lido sobre o modo de vida e de como os portugueses se relacionaram com os indígenas, como efectuaram a mistura de culturas, ou como conseguiram coabitar nativos com europeus e africanos.

Renato Fontinha leva a cabo um trabalho extraordinário de reconstrução desses tempos, dando-nos a imagem de como os portugueses conseguiram controlar os índios e, simultaneamente, amedrontar e “domar” os negros que eram trazidos de África como escravos.

O romance situa-nos em pleno séc. XVI, ano de 1550, numa altura em que portugueses e castelhanos tentavam tomar efectivamente posse das terras que lhes pertenciam, estabelecendo feitorias, erigindo colónias de modo a que os seus domínios se solidificassem, procurando também impor-se aos indígenas locais, não só pela força, como e principalmente, pela religião que tomava contornos de sobrenatural para os ingénuos índios que, dessa forma, eram explorados, sem contudo serem tratados como escravos.

Guiana, Congo, Brasil e a selva Amazónica, são os principais locais deste romance e onde o autor vai explorando e descrevendo a forma como os portugueses procuraram erigir colónias e a forma como se comportavam e relacionavam com os outros povos. Aqui, ressalta a enorme presença de degredados, pessoas violentas, assassinos e até pessoas perseguidas pela igreja, compunham a maioria dos portugueses que estavam a colonizar… imaginem!

O Rei de Portugal decide fundar uma colónia na foz do Amazonas e dá-lhe o nome de Nova Lisboa. Para além do governador que já se encontra nessa colónia em construção, a coroa envia alguns personagens cuja missão será o de compor os cargos de Estado e da Igreja. Dessa forma, desembarcam um tabelião honesto, mas medroso e cobarde e cuja maior ambição é enriquecer e ser amado pela sua jovem esposa que o trata dom desdém. Um padre com citações religiosas na ponta da língua, altamente corrupto e que pela absolvição dos pecados, recebe o pagamento em actos libidinosos.

Índios canibais, cuja maior honra, é partir ou partirem a cabeça à paulada e que vêm o sexo como algo muito natural. Negros que se vêm como escravos, mas que descendem da realeza, bandeirantes cujo único objectivo é traficar escravos e matar por vingança.

Um livro de leitura fácil, com capítulos curtos, mas que nos dão uma imagem daqueles conturbados tempos e da forma como Portugal se estabeleceu naquelas terras, ressaltando o enorme esforço que muitos fizeram para consolidar a presença portuguesa.

Uma obra que, para além de nos entreter, nos ensina e mostra o outro lado dos Descobrimentos. Um lado mais cruel e duro, onde se percebe por onde começou a coabitação e do porquê da facilidade da evangelização.

sábado, 19 de novembro de 2011

Bem-Vindo ao Céu… Malandro – João L. Bento


João Diogo, jovem veterinário e recém casado com Joana, que o autor não cansa de elogiar a sua beleza escultural, vive uma vida edílica com a sua esposa, parecendo que tudo é para sempre e a felicidade, a par com a sexualidade activíssima, jamais poderá terminar.

Porém, eis que João sofre um acidente de viação e… perde a vida, deixando na terra muito para fazer e muito para amar.

Este é o acontecimento central que vai marcar o ritmo e o sentido da história.

João, que está muito preso a esta vida, não acredita que morreu e que a mulher escultural que era sua, já não é, e, vai daí, não consegue libertar o espírito. No entanto, eis que surge o guardião, uma espécie de anjo que o vai ajudar a passar para o outro lado, mas será que João quer?

Gostei do livro porque o autor, assente num trama algo banal, conseguiu expor o que, quanto a mim, seria o seu principal objectivo: a vida espiritual.

Ou seja, o autor possui uma teoria e expõe-la nesta obra. Independentemente de crermos, ou não, o certo é que é curioso seguir o percurso de João desde a sua morte. Nessa teoria, o autor percorre a vida após a morte, e inclusivamente a reencarnação. Pessoalmente é algo que tenho opinião diferente, mas achei curioso e até faz algum sentido, ler sobre uma opinião diferente.

Algo que também me agradou, e confesso, até me deu gozo ler, foram os surreais diálogos entre João e Deus, por vezes utilizando linguagem vernácula. Acreditem que chega a ser profundos alguns desses diálogos e transbordam de ironia, mordacidade até.

A escrita é simples e fluida. Lê-se muito bem e entretém, pecando um pouco a forma repetitiva e abusiva como o autor refere a beleza escultural de Joana e o seus encontros lésbicos. Entendo que o autor quis dar algum erotismo à história, mas, a meu ver, peca pelo exagero com que repete as situações e as descrições dos encontros sexuais chegam a roçar o absurdo, tirando o interesse.

Em suma, um livro interessante que podia ir muito alem, pois o autor podia, face ao volume, ter explorado melhor a parte espiritual, em vez de perder tanto tempo com preliminares sexuais lésbicos que nada dão à história.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Ladrão de Túmulos (O) – António Cabanas


Extraordinário!

Cerca de 1200 a.C., Ramsés III, o segundo faraó da XX dinastia egípcia e considerado o último grande faraó do Império Novo, reina um imenso e respeitado império que se vê constantemente ameaçado por invasões.

Ficando para a História como um brilhante estratega, foi sob o seu reinado que aconteceram duas importantes e violentas batalhas que trouxeram paz, no entanto, é também no seu reinado que a decadência do império se torna visível face à cada vez maior influência da classe sacerdotal de Amón que acaba por tomar o poder através de Herihor, elevado a faraó no ano 1080 a.C, pouco mais de cem anos após Ramsés III.

A história da obra situa-se no reinado de Ramsés III e o autor leva a cabo uma descrição exaustiva e fascinante da civilização egípcia e, principalmente, do povo, gente comum, pobre, temente aos imensos deuses que povoavam o panteão egípcio.

Só por essa razão o livro teria todo o meu destaque, pois desconheço se algum autor alguma vez teve a coragem de tentar recriar uma sociedade com 3200 anos de antiguidade. No entanto, hoje em dia há um excelente conhecimento sobre o modo de vida, usos e costumes de todas as classes sociais, e o autor utiliza com mestria esses conhecimentos, transportando-nos a uma época nos primórdios da civilização.

Mas Cabanas consegue ir mais longe; para além de traçar um brilhante trama que mistura policial, drama e aventura, ainda nos brinda com um infindável número de informações acerca das crenças, dos deuses e da vida militar que explicam como Ramsés III conseguiu debelar perigosas invasões.

O único senão que achei na obra, mas que não impediu que eu devorasse o livro em dois dias, é a inverosímil relação de amizade entre um dos príncipes e um dos protagonistas da história.

Numa escrita cativante, o autor delineia um fresco do grande Império egípcio quando já se sentiam alguns ventos de mudança assentes em sinais de decadência. Até isso é explorado, fazendo-nos entender do porquê da progressiva queda.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Último Segredo (O) – José Rodrigues dos Santos


Neste seu novo romance, JRS traz de volta esse personagem que já começa a ser mítico, pelo menos entre os apreciadores dos livros de JRS, o historiador e criptanalista tuga chamado Tomás Noronha.

E, permitam-me já dizer, que é um regresso em grande forma.

Conforme acontece nos seus romances thrillers/policiais que muitos continuam a teimar em comparar aos de Dan Brown sem saberem bem o que estão a dizer, mas como acontece nos livros de JRS desse género, a história inicia-se com uma série de estranhos crimes, sendo que, para além do modus operandi do assassino, o que torna os factos mais estranhos são as estranhas “pistas” ou “mensagens” que esse assassino deixa nos locais do crime.

Ora bem, até aqui tem de facto muito de browniano. De facto! No entanto é apenas no início que podemos efectuar comparações. Bem sei que depois há a perseguição ao assassino, a descodificação dessas pistas, etc, etc. No entanto, a principal razão que gosto bastante dos romances de JRS é porque o homem sabe colocar acontecimentos verídicos à medida que vai urdindo um trama todo ele, ou quase, coerente. Ou seja, os romances de JRS ensinam-me, divertem-me e entretêm-me.

Já o disse em diversas alturas que a principal objectivo de um livro é o de entreter, divertir, levar-nos a viajar, fazer companhia e, se possível, ensinarem. Que adianta ler um livro considerado um portento da literatura, se essa leitura for penosa, aborrecida e enfadonha?

Posto isto, e voltando à obra, lá é chamado o Tomás a fim de resolver todos esses crimes. A acompanhá-lo, obviamente, uma beldade, nomeadamente uma agente policial italiana.

No desenrolar das investigações, Tomás Noronha apercebe-se que os enigmas deixados nos locais do crime aludem à própria Bíblia e à construção narrativa da mesma que teve como intenção crer em alguém que, se calhar, não foi bem aquilo que se quis e quer pintar.

E lá começam eles uma demanda por vários países da Europa que finda em Israel, a Terra Prometida, o local onde Jesus nasceu, foi criado e morreu.

Numa reconstituição de factos históricos que considero notável, JRS interpreta várias fases da Bíblia e demonstra que a mesma esconde muitas falsidades, a maioria, intencionais, que foram sendo criadas ao longo dos séculos. À medida que vai construindo esse “edifício”, vai demonstrando a verdadeira imagem de Jesus e não o faz de uma forma leviana, sem provas. O que ele efectua não é nenhuma novidade e não foi ele que inventou ou pensou nisso, o que ele faz é aplicar os conhecimentos Históricos à época e interpretar o que está escrito à luz desses conhecimentos.

Posso até admitir que algumas das análises são de facto algo simplistas como li algures. Porém, qualquer pessoa com os mínimos de conhecimentos Históricos e um pouco informada, não pode ficar surpreendida com os episódios narrados e a análise efectuada aos mesmos. Hoje em dia, é mais do que óbvio, que a Bíblia ou qualquer outro livro sagrado, foi escrito não pelos apóstolos, profetas ou a quem se atribui os textos sagrados, foi sim escrito por outros com a intenção de convencer.

Em suma, um bom livro em que o principal tema é, claramente, a demonstração que Jesus foi um homem comum e que a sua deusificação foi construída muito posteriormente e assente em inverdades e interpretações erróneas, que se lê com prazer e que nos faz pensar e ver o quanto ignóbeis foram e continuam a ser tantos. No entanto isso vale o que vale, penso que não vai alterar em nada a fé de cada um.