Júlia
Navarro faz parte da minha galeria de autores preferidos, daqueles autores cuja
edição anual (quando sucede) é sempre motivo de regozijo e que procuro ler logo assim que o
novo livro sai. Não são muitos os escritores por quem tenho este apreço e
simplesmente tenho-o porque sei, antemão, que o “novo” livro me vai agradar e promover
horas de puro deleite literário.
Este
“História de um Canalha” estava para ser lido há cerca de um ano, não o tendo
feito porque, neste último ano, estive dedicado profissionalmente a um projecto
e o tempo para me dedicar à literatura teria sido curto e porque, desconfiei
que se o começasse a ler, não descansaria enquanto não o terminasse, e sempre
são mais de 800 páginas.
E assim
foi, li-o em 4 dias.
Já
li centenas de livros, para não dizer milhares, e poucos foram aqueles cujas
personagens me marcaram. Sejam personagens boas ou más, mas, geralmente, o que
me encanta é o trama ou a qualidade literária do escritor, porém, tem havido
obviamente livros cujos personagens se sobrepõem há história e a “História de
Um Canalha” é um exemplo disso.
A
personagem central, Thomas Spencer é o mais puro pulha que podem imaginar.
Alias, não imaginam, estou certo!
Sinceramente
Thomas Spencer vai directamente para uma galeria de personagens cuja ruindade
fazem todo o trama do livro, comparo-o a Patrick Bateman de “Psicopata
Americano”, ou a Heathcliff dos “Monte dos Vendavais” ou até ao Juiz Holden do “Meridianode Sangue”, verdadeiros anti-heróis que nos conseguem ser repugnantes e odiosos pelas
suas (más) acções.
O
livro, dividido em quatro partes: Infância – Juventude – Maturidade – Declínio,
narra todo o percurso de vida de Thomas Spencer na primeira pessoa, ou seja, é
ele mesmo que nos vai narrando toda a sua vida e é do mais atroz que se possa
imaginar.
No
entanto, não se julgue que Thomas é um assassino e que anda por aí a matar
pessoas, nada disso, ele é simplesmente um puro canalha, sem qualquer tipo de
sentimentos de afectos, sem amor por ninguém, sem consideração e que tira
prazer em fazer sofrer os outros, levando, em alguns casos, à morte desses pela
angústia provocada por ele próprio. Ele mente, manipula, atraiçoa, engana, difama, destrói
sonhos e reputações, vigariza, sei lá, tudo o que de mais malvado um ser humano
pode ser. E o mais curioso é que à medida que ele vai narrando as suas “aventuras”,
tem laivos de consciência e coloca a hipótese de e se tivesse feito as coisas de uma forma diferente,
imaginando mesmo o cenário, no entanto e logo de seguida, afirma: “mas não foi
assim e não me arrependo”.
Segundo
Júlia Navarro, que demorou três anos a escrever este livro, a história e o
personagem tem a intenção de abordar o que actualmente se passa com a nossa
sociedade, um retrato da actual sociedade. Ela afirma que o livro tem três
bases. A Primeira é uma viagem ao mais recôndito do ser humano, a Segunda é uma
reflexão sobre a sociedade da comunicação e a terceira uma reflexão sobre o
poder.
E de
facto enquanto é claro que a segunda e a terceira reflexão são escalpelizadas
na forma de actuar de Thomas Spencer, é a primeira base que mais nos incomoda,
pois Navarro põe o dedo na ferida por diversas vezes e cria um personagem que
tem tanta maldade que acabamos nós mesmo por perceber que todos temos, nem que
seja um pouco, alguma coisa de Thomas.
Ou
seja, o perfil monstruoso que ela traça de Thomas Spencer vai acabar, aqui e
ali, por entroncar em algo que nós próprios somos, pois ninguém, absolutamente
ninguém é santo, e todos nós constatamos que aquilo com nos deparamos em alguma
altura é um pouco o nosso espelho e isso, meus caros e caras, torna-se incomodativo,
pois e acredito mesmo que possa até ser de uma forma inconsciente, nós próprios
já tivemos acções que vemos ali descritas e que são abomináveis.
Não me
vou alongar muito mais, no entanto e não considerando o melhor livro de
Navarro, este é uma obra incomodativa, que de facto nos obriga a uma reflexão
das nossas acções, percebendo também, e isso dá algum medo, que deve existir
por aí muitos Thomas Spencer cuja misericórdia e consideração são nulas.
Um
livro de leitura obrigatória!
Admito que sempre tive alguma curiosidade em relação a esta autora, mas ainda não calhou. Este também não deve calhar tão depressa, já que dizes que tem mais de 800 páginas e de momento não há tempo que chegue para isso. Mas vou experimentar outro, provavelmente ;) alguma recomendação?
ResponderEliminarPois, mas o problema é que qualquer livro de Júlia Navarro tem sempre para cima de 800 páginas. Mas acredita que as histórias dela são tão enleantes que facilmente lês por dia 150 páginas, a sério. São daqueles livros que passam a correr.
ResponderEliminarEu gostei muito de "Dispara, Eu já estou morto".
https://nlivros.blogspot.com/2015/06/dispara-eu-ja-estou-morto-julia-navarro.html
Fica na lista ;)
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