Numa Era em que a maioria das pessoas pouco ou
nada sabe de História, quero aqui relembrar a Batalha de La Lys no dia 09 de
Abril de 1918, ou seja, amanhã faz 100 anos.
Muitos perguntarão o que foi essa Batalha e em
que moldes?
Pois bem, estávamos na 1ª Grande Guerra e se
calhar muitos desconhecem que nesse Primeiro Conflito à escala Global, Portugal
participou com milhares de Soldados que, no Corpo Expedicionário, foram
enviados para França para, conjuntamente com mais uma série de outras nações,
fazer face à expansão germânica e austro-hungara pela Europa.
Portugal era um país, tal como é hoje,
pequenino, na limítrofe do continente Europeu, recentemente República que
lutava por ver essa república reconhecida pelos seus pares europeus, a grande
maioria monarquias que, obviamente, preferiam que Portugal continuasse
república. E foi nesse patamar que o governo português “conseguiu” com que os
alemães nos declarassem guerra que, devido ao facto da nossa aliança com os
britânicos, fez com que Portugal tivesse de enviar soldados para as trincheiras
em França. Antes disso já tinha havido várias quezílias com os alemães nas
nossas colónias africanas, no entanto é precisamente por perceber que tudo
estava preparado para nos “sacar” essas colónias, que o governo português se vê
na contingência de picar os alemães até os mesmos nos declararem guerra. E é aí
que Portugal ganha posição que, posteriormente, fez com que estivéssemos no
lado dos vencedores e, com isso, manter a República, bem como as nossas
colónias africanas.
Em Janeiro de 1917, zarpam do Tejo três
vapores britânicos com o 1ª Brigada do Corpo Expedicionário Português (CEP), comandados
pelo General Gomes da Costa, acabando por chegar efectivamente a França no dia
02 de Fevereiro. A 04 de Abril as primeiras tropas portuguesas ficaram
entrincheiradas e nesse mesmo dia dá-se a primeira baixa mortal: António
Gonçalves Curado é o primeiro soldado português morto em combate.
A partir daí, e sempre mostrando grande
eficiência e espírito combativo, as tropas portuguesas foram ganhando o
respeito dos seus pares e também dos boches que viam os portugueses como
combatentes corajosos e difíceis de vencer. Porém, à medida que os meses foram
passando, a moral das tropas começou a decair de uma forma vertiginosa. A juntar
às agrestes condições meteorológicas, as tropas portugueses nunca eram substituídas,
ou seja, quem ia para as trincheiras só poderia regressar se a guerra
terminasse ou no caixão. Claro que isso foi criando um sentimento de injustiça,
e, passado cerce de um ano, o alto comando português apercebeu-se que se as
tropas não fossem substituídas, o risco de um motim era elevadíssimo, pelo que
acabou por se encontrar uma solução com o comando britânico, ficando a
substituição das tropas portuguesas combinadas para Abril de 1918, ou seja, um
ano depois de estarem a combater.
O problema é que os alemães se aperceberam na
queda do moral das tropas portuguesas e engendraram um ataque surpresa contra o
lado português precisamente no dia em que estava combinado a rendição do CEP.
Esse ataque, que se julga ter sido do conhecimento dos britânicos dias antes,
dá-se precisamente no dia 09 de Abril de 1918, apanhando completamente
desprevenido as tropas portuguesas que, completamente relaxadas, apenas
pensavam no regresso a casa e às suas famílias.
Essa ofensiva, que ficou conhecida pela
Batalha de La Lys, foi uma ofensiva pensada e programada ao pormenor pelos
alemães e que resultou num completo desastre para as tropas portuguesas.
Sofrendo uma estrondosa derrota, os
portugueses viram catadupas de alemães vir ao seu encontro e só tiveram
tempo de ou fugir ou disparar em desespero. A batalha iniciou-se às 4:15 da
madrugada e terminou por volta das 12H (meio dia) e depois dessa hora, eram
milhares os portugueses mortos e desaparecidos, bem como milhares os que foram
feitos prisioneiros.
Oficialmente tivemos cerca de 7.000 (SETE
MIL), 423 soldados mortos, e outros milhares de feridos e desaparecidos, não se
sabendo, até hoje, números concretos e oficiais, no entanto prisioneiros foram
mais de 7.000, mais propriamente, 7440 soldados, e a certeza que foi o maior
desastre de sempre da nossa História quase milenar.
Hoje em dia à muita literatura que aborda a
participação portuguesa na 1ª Grande Guerra, no entanto quero evidenciar que
desde o início as tropas portuguesas foram enviadas para França como apenas “carne
para canhão”. O objectivo primordial era o governo português estar do lado dos
vencedores, o que até entendo, mas a grande maioria dos soldados eram homens
das aldeias de Norte a Sul de Portugal, analfabetos, que foram incorporados no
CEP, tendo apenas umas semanas de instrução militar. Porém eram homens
habituados à vida dura do campo e que, até ser possível, fizeram frente aos boches
e não deixaram que os mesmos furassem o lado que defendiam.
Após a batalha, o governo ainda pensou enviar
mais 15.000 soldados, envio esse que nunca foi concretizado devido à
indisponibilidade de transporte e de vontade do governo britânico, que estava
sim empenhada no transporte de soldados norte americanos, porém, com o resto do
CEP, ainda se conseguiu organizar alguns Batalhões que tomaram parte nas
últimas operações que levaram à vitória final dos aliados.
Muitos homens sobreviveram a esse fatídico
dia, o último dos quais falecido em 2002, com 107 anos de idade (José Maria
Hermano Baptista), porém, o mais conhecido é o Soldado Milhões. De seu nome
Aníbal Augusto Milhais, nasceu em Valongo no dia 09 de Julho de 1895. Conhecido
pelo Soldado Milhões, foi o soldado português mais condecorado na 1ª Grande
Guerra, e o único soldado português premiado com a mais alta honraria nacional,
a Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito, no campo de
batalha em vez da habitual cerimónia pública em Lisboa.
Sozinho na sua trincheira, apenas munido da
sua arma, uma metralhadora Lewis (Luísa) e cheio de coragem, enfrentou sozinho centenas
de alemães que se atravessavam no seu caminho, permitindo assim a retirada de
vários soldados portugueses e ingleses. Vagueando pelas trincheiras, Milhais
continuou a fazer fogo quando via um inimigo. Quatro dias depois salvou um
médico escocês de morrer afogado num pântano e foi este médico, para sempre
agradecido, que deu conta ao exército aliado dos feitos do soldado Milhais.
Regressado a
um acampamento português, o comandante Ferreira do Amaral saudou-o, dizendo o
que ficaria para a História de Portugal, "Tu és Milhais, mas vales
Milhões!
Muito há a
narrar sobre essa Batalha, no entanto quero aqui recordar o esforço e sacrifício
de milhares de homens que deram o seu sangue pela nação que, como sempre, pouco
ou nada lhes agradeceu, pois sabe-se que a maioria que regressou, foram à sua
vida e foram votados ao abandono e esquecimento, muitos deles morreram na mais sórdida
pobreza e miséria, muitos morreram devido a problemas respiratórios contraídos nas
trincheiras e, sobretudo, cem anos depois, é triste perceber que a maioria dos
portugueses nem sabe que foram milhares que participaram no esforço de Guerra
contra a expansão alemã.
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