sexta-feira, 16 de março de 2012

Deus das Moscas (O) – William Golding


Embora o ponto de partida desta obra seja a de um grupo de crianças perdidas numa ilha deserta, o que nos poderá levar a pensar tratar-se de uma obra vincadamente aventureira, o Deus das Moscas trata-se na verdade de uma enorme alegoria ao Ser Humano e às suas características que o tornaram no ser dominante do planeta e, em simultâneo, a sua verdadeira essência ou, se quisermos, a sua essência primordial.

Como premissa, temos um avião que se despenha numa ilha deserta situada algures. A bordo, várias crianças (e alguns adultos que morrem no desastre) que, dessa forma e sem adultos, se vêm sozinhas e completamente livres. Está dado o mote para o que Golding nos reserva e, embora possa aparentar tratar-se de um livro sobre crianças que se metem em aventuras para pesquisar e descobrir essa ilha, o certo é que Golding traça-nos a complexa cadeia da sociedade humana com todas as suas vertentes, incidindo no que mais negro o ser humano possui.
É também importante ressalvar que William Golding procurou com esta obra criar uma metáfora às questões que se colocaram após a Segunda Guerra Mundial. Golding participou como soldado nesse conflito e célebre ficou a sua seguinte afirmação: “Qualquer pessoa que tenha passado por esses acontecimentos terríveis sem entender que o homem produz o mal como a abelha produz o mel estava cega ou louca”. Ou seja, por essa frase, facilmente se compreende ou se encontra analogias a este Deus das Moscas. Por isso, é importante olhar para esta obra como um grito do próprio Golding à sua percepção das propriedades imutáveis do Homo Sapiens.
É uma história que nos marca e que nos vai hipnotizando á medida que sulcamos pelas suas páginas. A ambição desmedida pelo poder é o polo que vai despoletar os conflitos que se iniciam à medida que esses miúdos vão se dando a conhecer. No entanto, bem ou mal, há uma construção de sociedade alicerçada em moldes muito frágeis mas que se vai mantendo numa linha muito fina que se rompe quando os conflitos se iniciam e os egos são colocados à prova. E, dessa prova de fogo, rompe, com uma forma monstruosa, as características maléficas que nos vão surpreender e assustar, pois facilmente constatamos que vivemos numa sociedade… igual.
Uma obra genial, assustadora e perturbante.

11 comentários:

Unknown disse...

Olá,
Li esse livro há muitos anos como leitura de uma disciplina na faculdade. E confesso que detestei. A história pelo menos. Fiquei estarrecida com aquela história, enojada mesmo.
Hoje, passado uns anos, provavelmente um pouco mais cínica e descrente, leria o livro de outra forma. Mas tenho a certeza que o sentimento de tristeza com que terminei a leitura seria o mesmo.
Por isso concordo: genial (a um livro que me conseguiu transmitir sentimentos tão fortes só posso chamar genial) e assustador.
Boas leituras

Unknown disse...

Olá Iceman!
Nunca li este livro mas penso que já vi um filme com este enredo...
Houve alguém que disse que num choque de culturas ou civilizações o que sobrevive é o pior de ambas.
A organização da sociedade - qualquer uma - é assente no medo. A lei do mais forte ou do mais hábil tem no medo que inspira aos demais um forte factor para o sucesso.
Embora chocante não me parece nada de espantar a violência entre estas crianças. Trata-se apenas do cumprir do ritual estabelecido para a organização de uma sociedade de seres humanos...
Um abraço!

Unknown disse...

Olá Iceman
concordo com a interpretação que fazes da obra; a sociedade é capaz de alterar por completo a natureza humana; aquelas crianças não eram más, mas a convivência conduz à competição e a todos os sentimentos negativos...
Perturbador, de facto... é um livro que me marcou.

susemad disse...

Deveras "uma obra genial, assustadora e perturbante"!
Um livro que mexe demasiado com os sentimentos do leitor. Deixa-o inquieto.
Arrepia!

NLivros disse...

Olá Patrícia.

É, quando temos de ler obrigados, geralmente não conseguimos apreciar a obra. É assim, por exemplo, com os Maias, livro genial e que tantos dizem detestar.

NLivros disse...

Olá André!

É bem possivel porque já houve adaptação para o cinema. Não vi o filme e, curioso, nunca me senti muito atraído. Talvez por medo de o mesmo disvirtuar a intenção do livro.

Sim, de facto não espanta isso suceder com crianças.

Abraço!

NLivros disse...

Olá Manuel!

A sociedade humana é terrivel. Esta obra foca um dos "nossos" aspectos, no entanto a literatura está cheia de outras análises.

É um livro espantoso!

NLivros disse...

tonsdeazul!

O livro é inquietante e deixa-nos assustados porque sabemos, até de uma forma consciente, que nós somos assim, e isso, debaixa da mascara diária, assusta.

Paula disse...

Olá Iceman,
Terminei este livro há pouco tempo e uma das frases que mais me marcou foi no fim, quando o oficial que os encontra diz mais ou menos assim: "Eu esperava que vocÊs, rapazes britâncios fossem capazes de fazer mais do que isso..." acho que esta frase reflecte o que referes/ o que Golding refere ao dizer " “Qualquer pessoa que tenha passado por esses acontecimentos terríveis sem entender que o homem produz o mal como a abelha produz o mel estava cega ou louca”. Está visto que o oficial não passou e daí o seu pensamento. Será que estou certa? :)

NLivros disse...

Olá Paula!

Muito bem observado, conseguiste captar, de facto, a essência do pensamento de Golding. Honestamente não me recordava dessa frase, mas tinha na ideia que o oficial havia efectuado uma observação que continha precisamente o pensamento de Golding. Independentemente da nacionalidade ou educação, o Ser Humano produz o mal de uma forma gratuita.

Aguardo a tua opinião! :D

Unknown disse...

Olá Iceman,
Apesar de ter lido "obrigada" não foi por isso que não gostei. Não deixei de apreciar a escrita e a forma genial como a história foi contada.
Achei-o duro, sem esperança, lúgubre. Como disse, hoje, uns anos passados, provavelmente (e infelizmente) não me revoltaria tanto.
E por acaso adorei os Maias, os Lusíadas e outros livros que fui obrigada a ler.
É pena que não ter a mesma opinião que a passada no post leve a um "não soubeste apreciar a obra".
Boas leituras