segunda-feira, 2 de julho de 2018

Malta das Trincheiras (A) : migalhas da grande guerra: 1917-1918 – André Brun


100 anos volvidos depois da participação portuguesa na Primeira Grande Guerra, centenário que poucos referiram mas que teve ocasião em Abril passado (2018), a Sociedade Portuguesa de Autores com a parceria da editora Guerra e Paz, teve a hombridade de reeditar um dos principais testemunhos desse conflito e, talvez, o testemunho mais conhecido e mais estudado a nível nacional: A Malta das Trincheiras do Capitão André Brun, ele próprio dramaturgo, cronista e argumentista de filmes, bem como um dos fundadores, em 1925, daquela que é hoje a Sociedade Portuguesa de Autores.


André Francisco Brun nasceu em Lisboa em Maio de 1881, vindo a falecer na mesma cidade em Dezembro de 1926 aos 45 anos.


Conhecido dramaturgo, autor de obras, à altura bem conhecidas, como a “Maluquinha de Arroios” ou o filme “A Vizinha do Lado”, André Brun, para além da sua actividade de escritor/cronista, seguiu a vida militar, alcançando a patente de major por distinção dos seus serviços na Primeira Grande Guerra onde comandou o batalhão de Infantaria 23 do C.E.P., e é precisamente a narração do que ele foi assistindo na Primeira Grande Guerra que nasce “A Malta das Trincheiras”.


Num tom muito divertido, mas simultaneamente sério e pungente, traça um retrato do quotidiano dos soldados portugueses nas trincheiras em La Lys durante a Primeira Grande Guerra. 


Crónica de humor, mas também carregada de sentimentalismo e humanismo, André Brun, deixando sempre no ar a tragédia humana que é a guerra (e esta especialmente), vai narrando episódios que têm o espaço temporal de pouco mais de um ano, centrando-se o seu início em Fevereiro de 1917 a Agosto de 1918, altura em que chega a Portugal e deixa para trás uma guerra que o marcou física e espiritualmente para sempre assim como todos aqueles que lá andaram e sobretudo andaram nas trincheiras.


Ou seja, André Brun estava presente quando se deu a grande ofensiva alemã no dia 09 de Abril de 1918 e que dizimou parte do exército português. A sorte dele e do seu batalhão é que nesse dia tinham sido rendidos e estavam já a alguns quilómetros da frente, mesmo assim ele descreve os acontecimentos com uma frieza notável ao mesmo tempo que deixa bem claro da enorme valentia de todos aqueles que, apanhados desprevenidos, combateram os boches e, em clara inferioridade numérica e psicológica, aguentaram o que puderam.


A ofensiva de 09 de Abril está bem documentada, mas o que vai sobressaindo deste livro é o dia-a-dia das tropas portuguesas e de como os soldados portugueses viam o conflito e se comportavam e, a leitura atenta que efectuei é claro que esta obra tem servido de influência e tem sido um manancial de informações para alguns que têm produzido obras da Primeira Grande Guerra.


E André Brun deixa também claro outros factos. Ele não relata apenas episódios dos soldados portugueses, ele traça também vários comentários das tropas inglesas e, sobretudo, da excelente opinião que os ingleses tinham dos soldados portugueses, pois várias vezes ele refere que oficial X ou Y lhe referiram da boa têmpera e fibra do soldado português, traçando também algumas criticas ao governo e ao alto comando português, pois várias vezes ele refere que houve muitos soldados portugueses que foram condecorados com cruzes de guerra britânicas e que, embora ele as tenha pedido insistentemente, o governo português nunca sequer enviou medalha alguma.


Por outro lado a critica aos Cachapins e Palmípedes é feroz e explica porquê, bem como deixa claro algo que hoje em dia é bem conhecido, a maioria dos oficiais vinha a Portugal em gozo de licença e, cunha aqui, cunha ali, nunca mais voltava a era a arraia-miúda que por lá combatia e defendia a nação.


No fim, para além da marcha da sua Infantaria 23, ele descreve o momento de partida para Lisboa depois de 16 meses nas trincheiras: “Subi para o carro que havia de levar-me à estação. Os meus melhores amigos abraçaram-me na estrada; e quando o cocheiro fustigou as alimárias, quando a largo trote das muares passei junto da minha sentinela que se perfilava, pus-me de pé para retribuir a continência e duas lágrimas me caíram pela cara abaixo”.






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