
Ana Karenina é considerado um dos grandes clássicos da literatura, não só pela sua vertente Histórica onde é abordada e descrita a sociedade russa do séc. XIX, como também pela sua vertente psicológica e filosófica, pois Tolstoi realiza minuciosos estudos às suas personagens, assim como não se coíbe de efectuar várias dissertações filosóficas e religiosas.
A obra relata as vidas cruzadas de várias famílias que têm entre elas sempre um ponto em comum. Dessas famílias, sobressai a personagem de Ana Karenina, mulher da alta sociedade, casada com um importante homem de estado e mão afectuosa de uma criança de 9 anos (se não estou em erro). Acontece no entanto que Ana apaixona-se por um jovem e galante conde (Vronsky), começando então uma relação intensa que irá escandalizar toda S. Petersburgo. Resolvido a não prejudicar a sua brilhante carreira, o marido de Ana fecha finge que nada se passa, até que em face de um acontecimento, é obrigado a tomar consciência da realidade e a tomar uma decisão... E mais não conto!
Claro que todas as outras personagens do livro são importantes. Na minha opinião existem dois ou três personagens cuja presença é imprescindível à beleza do drama, no entanto é inegável que a heroína é Ana Karenina e é nela que toda a história assenta.
Escrita entre 1875 e 1877 (depois de Guerra e Paz), Tolstoi joga com um assunto altamente polémico em todas as culturas ocidentais: o adultério. E, ainda descontente com este assunto, lança mais lenha para a fogueira: os valores morais, religiosos e políticos. Todas estas componentes juntas e misturadas, com uns pózinhos de filosofia do próprio autor, põe o leitor diante de um autêntico combate entre o bem e o mal, entre a imperfeição e a virtude. É intensa a forma como Tolstoi descreve as lutas morais dos personagens, aliás, chega a ser incomodativo a forma como o faz, porque quer queiramos quer não, nós próprios acabamos por entrar na discussão e tomar partido por ou contra alguém.
Para além disso, achei interessante a abordagem do autor aos sistemas que me pareceram ser o socialista e o comunista (pelo menos na sua génese). A forma como esses sistemas poderiam ser introduzidos e nos benefícios que trariam aos camponeses, assim como achei delicioso a forma irónica como Tolstoi aborda a teoria do capitalismo: Analfabetismo = Baixo custo de mão de obra = Riqueza dos burgueses.
Mas e não querendo alongar-me mais, porque este é um livro que tem muito para analisar e se o fizesse nunca mais daqui sairia, findo afirmando que esta obra é uma das melhores que li até hoje. Não se pense que se trata de uma mera história de amor, nada disso, Tolstoi, um mestre do realismo, efectua uma vasta análise à sua sociedade nos seus vários extractos (alta, média e baixa), conseguindo transmitir-nos todo aquela ambiente de uma Moscovo e S. Petersburgo cheias de tradições. E é curioso que, as personagens são tão intensas que facilmente damos por nós a "tocá-las", a "senti-las", a "falar" com elas. Ou seja, Tolstoi consegue fazer interagir as personagens com o leitor, consegue com que o leitor sinta os seus problemas, as suas dúvidas, as suas angústias, os seus dramas.
O final do romance é um bocado abrupto, pessoalmente não fiquei satisfeito, teria-lhe dado outro final que penso ter sido plausível, no entanto é precisamente nesse final que está a resposta a todas as questões que vão sendo colocadas: Devemos lutar pela nossa felicidade contra tudo e contra todos?; Até onde devemos seguir os costumes da sociedade? Devemos preocuparmo-nos com o que os outros dizem?