sábado, 24 de novembro de 2018

Herança de Eszter (A) – Sandor Marai


Este era um daqueles livros, e ainda possuo muitos, que andava pelas estantes há alguns anos à espera de ser lido. Tinha conhecimento da qualidade literária de Sandor Marai, mas, confesso, a sinopse nunca me cativou por aí além, julgando sempre estar na presença de uma obra menor do autor. Puro engano!

Antes de qualquer consideração, reconheço que fiquei atordoado pela qualidade da escrita de Marai. Possui uma forma simples de escrever, mas, ao mesmo tempo, dura, directa, objectiva e, simultaneamente, poética, fazendo com que a conjugação das palavras seja uma sinfonia no seu todo, quase como algo que nos vai afagando a alma com pedaços crus de realidade. Ou seja, à medida que nos vai narrando, de forma soberba, a história, é capaz de descrever, em poucas palavras, o intimo da personagem e os seus pensamentos, colocando-nos na “sua pele” e fazendo-nos viver essa existência. 

Achei fenomenal como o autor conseguiu com que eu “sentisse” as dores e angustia de todas as personagens deste livro, tanto as personagens maiores como menores, consegui com que compreendesse o ponto de vista de cada um deles, e isso é algo que só alguém que possui o dom da palavra na escrita.

O livro é curto. São menos de 200 páginas, em letra considerável, com capítulos muito curtos, mas desengane-se que o autor fica aquém do pretendido. Não! Penso ser este um livro que tem as palavras certas, pois não são necessárias muitas para, um escritor com qualidade, contar uma história.

Tem um ritmo alucinante, perturbador e inquieto. A força das principais personagens extravasa o próprio livro, pois dei por mim a visualizar, em pessoas que conheço, as descrições que ia lendo num misto de emoção e afecção. E mais curioso é ir percebendo que o desenrolar de todo o enigma é perturbadoramente simples, pois a verosimilitude é tão real que até arrepia.

Em suma, um livro altamente aconselhável para quem aprecia efectivamente boa literatura.