quinta-feira, 31 de julho de 2008

Desgraça - J.M. Coetzee


David Lurie, cinquentão e divorciado, é professor universitário de literatura. Vive sozinho e para dar mais sabor à sua aborrecida vida, frequenta pontualmente às 14H das quintas-feiras, uma jovem prostitua de nome Soraya.

Tardes de prazer dão a David uma sensação de afeição que é brutalmente interrompida quando Soraya lhe comunica que se irá ausentar.

Sentindo-se abandonado e rejeitado, Lurie acaba por se aproveitar da fragilidade psicológica de uma aluna para com ela ter um caso, originando um escândalo na comunidade escolar que o faz cair em desgraça.

E é neste estado que ele resolve desaparecer, indo visitar a sua filha que vive numa comunidade no interior do país. No entanto as desgraças não param de suceder...

Este livro, que aquando da sua publicação deu origem a intensos debates na África do Sul, expõe de uma forma brutal o ressentimento e as tensões raciais que surgiram após a queda do Apartheid.

As desgraças de David simbolizam a desonra e a humilhação que caracterizaram as relações entre raças sul-africanas. O choque entre o passado e o presente, entre duas culturas sem quaisquer laços históricos e fraternais que originam uma situação explosiva que ainda hoje se mantém.

A teia que Coetzee vai tecendo é magistral. Ele coloca-nos, de uma forma crua, questões de opção completamente opostas.

A dor física sobrepõe-se à psicológica e inversamente. Somos levados a optar por uma ou por outra, o bom torna-se mau e o mau, bom. Destinos com perspectivas de futuro assustadoras.
Um livro incómodo que nos faz parar várias vezes face à brutalidade, várias vezes psicológica e moral, dos acontecimentos que assolam o quotidiano de David.

Um livro notável!

domingo, 27 de julho de 2008

Crónica de uma morte anunciada - Gabriel Garcia Marquez

Ângela Vicário, poucas horas depois do seu casamento, é devolvida à família pelo seu recente esposo, supostamente por não ser virgem na noite de núpcias.

Assolada pela vergonha, a família de Ângela pressiona-a no sentido dela dizer quem foi o causador de tal descaramento , acabando por nomear Santiago Nasar como o causador dessa desfloração.

Completamente cegos por vingança, os irmãos de Ângela, pegam em facas de matar porcos e, informando que com eles se cruza no caminho, vão em busca de Santiago para o matarem, o que conseguem de um modo verdadeiramente atroz.

Muitíssimo bem escrito, o que é normal em Garxia Marquez, um dos factos que tornam o livro curioso e sui-generis, é o facto que desde a primeira página, sabermos que Santiago já morreu assassinado pelos irmão Vicário.

A questão aqui centra-se não no porquê desse assassinato, pois e de acordo com a sui-generis e fantástica sociedade rural colombiana parece ser normal tal acontecer, mas a questão central reside precisamente na própria crónica dessa morte que narra as últimas horas da vida de Santiago, principalmente a sua última hora.

Um excelente livro, baseado num acontecimento verídico, que considero ser até o livro ideal para entrar no mundo fantástico de Garcia Marquez. Uma história que narra um acontecimento aparentemente banal, mas é essa aparente banalidade que é fascinante. No entanto parece-me que Garcia Marquez tem o condão de tornar especial tudo o que escreve.

sábado, 19 de julho de 2008

Caçadores de Mamutes (Os) - Jean M. Auel


Em os "Caçadores de Mamutes", divido em dois volumes, voltamos a encontrar Ayla, agora já uma jovem e bela mulher com a capacidade de discernir o seu mundo e as diferenças que a separam daqueles que a criaram.

Neste terceiro volume, e não querendo entrar em detalhes, pois poderia estragar o prazer da descoberta e da surpresa, Ayla parte para a terra dos Mamutes, animais imponentes que eram a base da alimentação da altura.

Atravessando planícies sem fim, Ayla acaba por encontrar uma terra habitada pelos da sua espécie, no entanto ela própria sabe que também cada vez está mais longe da tribo que a criou e onde ela ainda tem motivos para amar...

Este terceiro volume, pese embora Auel continue o estilo e a forma narrativa assente, como já referi, em factos Geológicos e Históricos reais, perde imenso para os dois antecedentes.

Não vou aqui mencionar as principais razões porque considero essa perda, sobretudo porque iria cair em considerações sobre acontecimentos da própria história, mas há algo que está subjacente à própria extensão da obra, que é algum cansaço e saturação que se nota na escritora, assim como uma natural saturação do próprio leitor, pois repare-se: quando chegamos a este "Caçador de Mamutes", já levamos dois volumes lidos num total de cerca de 1.000 páginas. Sobre a época descrita, sobretudo sobre a coexistência entre o Homem de Neanderthal e o de Cro-Magnon já tudo foi praticamente dito em o "Clã do Urso das Cavernas" e o "Vale dos Cavalos" assim, este presente livro torna-se algo repetitivo nessas descrições, caindo assim também na repetição ao nível das situações, sobretudo quando Auel parece ter considerado o sexo como um escape ao argumento.

Pessoalmente gostei, mas não escondo que me decepcionou imenso. Vinha embalado com os outros dois e foi deveras frustante ver e sentir que a própria escritora estava mortinha para acabar com a história.

Obviamente que o livro tem a sua Qualidade. Lê-se bem e é curioso constatar a evolução de Ayla, mesmo a sua evolução no contacto com os da sua espécie, porém este fica muito aquém do esperado e exigível.

Mas existem algumas análises que se podem fazer, sobretudo no contexto social, nomeadamente ao nível do comportamento em grupo, podendo mesmo afirmar que este livro efectua uma curiosa análise aos primórdios dos comportamentos entre indivíduos.

domingo, 13 de julho de 2008

Benevolentes (As) - Jonathan Littell


Aclamado e vencedor de Prémios em praticamente todo o mundo, “As Benevolentes” é um calhamaço de 900 págs. tido já como um futuro clássico da literatura e comparado a obras do Cânones da literatura ou de mestres como Dostoiesvky, Tolstoi, Dickens ou Hugo.

Littell propõe-se a narrar as memórias de um ex-oficial nazi, hoje em dia um notável e respeitável empresário, que ocupou um importante lugar na hierarquia do partido, tendo tomando parte na questão judaica e não só.

A história inicia-se alguns anos antes do conflito de (1939-1945). Maximillian Aue, de uma forma pragmática e aparentemente se remorsos, narra parte da sua infância e juventude até à sua casual entrada no partido nazi. A partir daí há toda uma ascensão na hierarquia que o leva a estar presente na invasão à Rússia, passando por diversos campos de concentração onde foi um dos organizadores dos mesmos.

Descreve assim a origem e início das deportações, os interesses das mesmas e das perseguições lavadas a cabo em toda a Europa, assim como vai descrevendo situações de guerra, sobretudo, para mim das mais interessantes e cruéis, a Batalha de Estalinegrado, considerada como a batalha mais sangrenta de toda a História das guerras, onde pareceram, em apenas 6 meses, 1,5 milhões de pessoas, entre soldados e civis.

Obviamente que nesses aspectos o livro é muito interessante, mas, globalmente o livro aborreceu-me imenso.

O autor prende-se demasiadamente em diálogos que não levam a lado nenhum. Diálogos vazios, de ocasião, colocados em exagerados jantares, almoços e encontros que até admito pretender mostrar o vazio da vida da elite alemã, mas que de interessante nada têm e que têm o condão de cortar o ritmo que o livro por vezes consegue.

É notória a intenção do autor em chocar com os pormenores de alguns detalhes que até podiam servir como um tempero para os acontecimentos que se seguem, no entanto, pese embora esses pormenores e para a história que narra e para o que procura contar, é um livro demasiado volumoso com dezenas e dezenas de páginas de pura palha, arrastando-se numa modorra irritante e sonolenta.

Embora todas as sinopses falem de descrições de atrocidade como sendo algo que marca o livro, elas são diminutas, aqui e ali pontuadas com alguma crueldade, mas longe de serem extremamente chocantes, pois já tenho lido noutros romances descrições muito mais realistas e cruéis, aliás, facilmente me dei conta de inúmeros clichés na história (as crianças que são arrancadas às mães, famílias separadas, assassinatos a sangue frio).

Um livro muito decepcionante que não faz jus ao marketing que foi criado e muito menos às supostas comparações com outras obras épicas como “Guerra e Paz” conforme li algures. Só alguém de má fé, que não tenha lido a obra de Tolstoi ou um brincalhão, pode comparar a obra de Tolstoi a este “Benevolentes”, aliás, comparar um ao outro é como comparar a “Pirâmide de Gize” ao Centro Comercial das Amoreiras.

No entanto é um livro que exige muito do leitor. Uma aturada atenção página a página assim como uma atenta análise aos pormenores pois, e deixo aqui uma ressalva à minha opinião, este é livro que irá merecer de certo uma posterior releitura da minha parte, pois é um livro, pese embora a minha sincera opinião acima exposta, onde me ficou uma sensação de algo que me passou despercebido, algo como mensagens que me passaram ao lado.

Tal como já anteriormente aconteceu (por exemplo em “O Perfume”), este pode ser um livro cuja minha opinião mude drasticamente aquando da sua releitura, pois sinto que não retirei todo o potencial do livro.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Vale dos Cavalos (O) - Jean M. Auel


Este "Vale dos Cavalos" é o segundo da tetralogia "Os Filhos da Terra", iniciada como o fabuloso "Clã do Urso das Cavernas".

Tal como no primeiro volume, e outra coisa não seria de esperar, somos novamente transportados até ás planícies asiáticas de há 25.000 anos em pleno período Paleolítico.

A história segue exactamente a linha iniciada em "O clã do urso das Cavernas". Ayla é agora uma adolescente em constante conflito com os membros do clã que a adoptaram. Ela é diferente deles e começa-se a aperceber não só dessas diferenças como e principalmente das capacidades que os outros não têm. Obviamente que isso, e ainda por mais sendo fêmea, provoca nos outros um sentimento de frustação, ira e inveja, o que irá levar a naturais conflitos e uma expulsão do clã, partindo assim Ayla em busca dos da sua espécie.

Jean M. Auel é novamente brilhante na forma como descreve não só a época em si, como na abordagem das práticas e costumes do Homem de Neanderthal e Cro-Magnon.

A história é profundamente terna, conseguindo também ponto de viragem absolutamente fantásticos, pois vão sendo lançados factos violentos que marcavam, de uma forma natural, aquela época tão longínqua como igualmente desconhecida.

Obviamente que muito da obra é puramente ficcional, sobretudo no aspecto do relacionamento e coexistência entre esses dois grupos de hominídeos, no entanto a escrita de Auel é tão viva e interessante que facilmente nos deixamos engolir pela narrativa, sendo então arrebatados para aquela época.

Um volume muito bom, mas que já não tem aquela áurea que nos surpreende em "O clã do urso das cavernas", sobretudo porque após o brilhantismo do primeiro volume, é lícito esperar-se uma continuação melhor ou igual.

Claro que existem muitos pormenores Históricos, mas deixo que descubram isso por vocês próprios.