Francisco Moita Flores, ex-criminologista e actual Presidente da Câmara de Santarém, é um profícuo escritor, dono de uma já admirável bibliografia da qual destaco o seu último romance “A Fúria das Vinhas”.
Admirador do seu trabalho foi com surpresa que me deparei com este título “Não há lugar para divorciadas”, livro publicado em 2003 e que, pareceu-me, é uma espécie de ensaio da sua própria escrita.
A história passa-se em Lisboa trinta anos no futuro a partir do momento em que começar a ler pois, como o autor refere, estes acontecimentos são iguais quer daqui a 30 anos, quer 30 anos após esses 30 anos...
Como facilmente se constata, o livro é imensamente irônico e mordaz, levando facilmente às gargalhadas tal a paródia corrosiva que Moita Flores constrói.
A premissa é básica: mostrar como um mentecapto da nossa sociedade chega a ministro. E isso é algo bastante comum.
Leônidas Tábuas que arranja Távora como nome artístico (ficava mal um político chamar-se Leônidas Tábuas), um “Zé ninguém” que foge da sua aldeia acusado de vender droga e roubar galinhas, vê-se, com 30 anos, atrás de um balcão no bar de um partido político.
Como foi lá parar?
Vivendo de trabalhos esporádicos, Leônidas é convidado por uns amigos para colar cartazes a troco de bom dinheiro. Vendo que era trabalho fácil, Leônidas decide filiar-se no partido, pois os prosélitos do partido tinham sempre a primazia para este tipo de trabalho e havia que aproveitar.
No entanto, sem saber bem como, acaba por conseguir trabalho no bar do partido onde tudo se ouve e tudo se sabe, condição sine qua non para se construir uma carreira política de sucesso.
De influência em influência, o imbecil do Leônidas consegue chegar a deputado de última fila, local onde se metem os imbecis sem opinião e que nunca abrem a boca. Porém não se fica por aqui e consegue chegar a ministro...
Moita Flores escreveu este livro, repito, em 2003, logo, longe de imaginar que um dia seria político. Porém, ele expõe ao ridículo a política e a vaga de interesses que a varre, assim como os motivos que a grande maioria (aí uns 99%) dos políticos tem.
Opinando de uma forma muito objectiva sobre os meandros da política e dos partidos (chega a dizer que na política os inimigos são aqueles que estão dentro do partido, pois são esses que querem o lugar que agora ocupas) e até da influência e interesses da comunicação social, caracteriza de uma forma corrosiva o político comum: um ser estúpido, intelectualmente incapaz, lambe botas, supérfluo, preguiçoso, demagogo, apenas interessado no dinheiro e no poder.
Inclusivamente é corrosivo nalgumas indirectas que vai distribuindo, como por exemplo, quando refere o caso de um capitão que na guerra roubava batatas para vender e que ainda foi promovido a major... penso que todos sabem a quem se destina tal farpa.
Caracteriza também um futuro onde a obcessão pela Al-Qaeda é paranóica, num mundo supervisionado pelos norte-americanos que tal como um big brother, tudo vêm e tudo controlam.
É um livro delicioso, de leitura muito fácil (li-o em pouco mais de 3 horas), sem uma grande construção literária, pois aqui a idéia é mostrar o ridículo, a banalidade, a hipocrisia e a superfluidade dos políticos.
Quer seja agora, quer seja dentro de 30, 40, 50 ou 60 anos.
Mudam apenas as moscas.
Há dúvidas?
Excertos:
”- E o seu genro? Se o senhor não quer ser ministro de Estado, eu insisto para que o seu genro entre neste Governo”.
- Dá-me jeito. O tipo é um sorvedouro de dinheiro e a minha filha vai ficar contente.
- E pensar numa pasta para ele?
- Dá-lhe uma dessas pastas para imbecis. Sei lá, o Desporto, a Educação.
- Para a Educação estava a pensar no Fernandes. Não é estúpido mas é um grande mentiroso. E quando ao Desporto, não sei se é um bom futuro para a sua família.
- Não?
- Como os dirigentes que temos no futebol, precisamos de um ministro igual a eles para que se entendam. Alguém que seja analfabeto, suficientemente ordinário, que goste de contar anedotas, de almoçaradas, que arrote sonoramente e putanheiro. Para alem de tudo isto, é bom que se deixe corromper barato porque senão custa-nos uma fortuna!”
“- Uma espécie rara senhor almirante. Vive da treta, odeia o trabalho e vive da treta. Uma língua alcoolizada, uma imaginação prodigiosa, uma capacidade excepcional para a preguiça e, apesar de profundamente ignorante, fala todas as línguas que o engenho exija e disserta sobre qualquer assunto com mais convicção do que um acadêmico letrado.
- Está a falar dos portugueses.- Não. Estou a falar dos portugueses refinados. O verdadeiro chulo adora mulheres, sobretudo para lhe passarem a roupa e apertarem os cordões dos sapatos, anseia por uma boa briga, pela-se pela intrigalhada, embebeda-se diáriamente, nunca trabalha, aliás, odeia quem trabalha, e é o rei da inveja. A inveja é um pecado português, sabia?”
Admirador do seu trabalho foi com surpresa que me deparei com este título “Não há lugar para divorciadas”, livro publicado em 2003 e que, pareceu-me, é uma espécie de ensaio da sua própria escrita.
A história passa-se em Lisboa trinta anos no futuro a partir do momento em que começar a ler pois, como o autor refere, estes acontecimentos são iguais quer daqui a 30 anos, quer 30 anos após esses 30 anos...
Como facilmente se constata, o livro é imensamente irônico e mordaz, levando facilmente às gargalhadas tal a paródia corrosiva que Moita Flores constrói.
A premissa é básica: mostrar como um mentecapto da nossa sociedade chega a ministro. E isso é algo bastante comum.
Leônidas Tábuas que arranja Távora como nome artístico (ficava mal um político chamar-se Leônidas Tábuas), um “Zé ninguém” que foge da sua aldeia acusado de vender droga e roubar galinhas, vê-se, com 30 anos, atrás de um balcão no bar de um partido político.
Como foi lá parar?
Vivendo de trabalhos esporádicos, Leônidas é convidado por uns amigos para colar cartazes a troco de bom dinheiro. Vendo que era trabalho fácil, Leônidas decide filiar-se no partido, pois os prosélitos do partido tinham sempre a primazia para este tipo de trabalho e havia que aproveitar.
No entanto, sem saber bem como, acaba por conseguir trabalho no bar do partido onde tudo se ouve e tudo se sabe, condição sine qua non para se construir uma carreira política de sucesso.
De influência em influência, o imbecil do Leônidas consegue chegar a deputado de última fila, local onde se metem os imbecis sem opinião e que nunca abrem a boca. Porém não se fica por aqui e consegue chegar a ministro...
Moita Flores escreveu este livro, repito, em 2003, logo, longe de imaginar que um dia seria político. Porém, ele expõe ao ridículo a política e a vaga de interesses que a varre, assim como os motivos que a grande maioria (aí uns 99%) dos políticos tem.
Opinando de uma forma muito objectiva sobre os meandros da política e dos partidos (chega a dizer que na política os inimigos são aqueles que estão dentro do partido, pois são esses que querem o lugar que agora ocupas) e até da influência e interesses da comunicação social, caracteriza de uma forma corrosiva o político comum: um ser estúpido, intelectualmente incapaz, lambe botas, supérfluo, preguiçoso, demagogo, apenas interessado no dinheiro e no poder.
Inclusivamente é corrosivo nalgumas indirectas que vai distribuindo, como por exemplo, quando refere o caso de um capitão que na guerra roubava batatas para vender e que ainda foi promovido a major... penso que todos sabem a quem se destina tal farpa.
Caracteriza também um futuro onde a obcessão pela Al-Qaeda é paranóica, num mundo supervisionado pelos norte-americanos que tal como um big brother, tudo vêm e tudo controlam.
É um livro delicioso, de leitura muito fácil (li-o em pouco mais de 3 horas), sem uma grande construção literária, pois aqui a idéia é mostrar o ridículo, a banalidade, a hipocrisia e a superfluidade dos políticos.
Quer seja agora, quer seja dentro de 30, 40, 50 ou 60 anos.
Mudam apenas as moscas.
Há dúvidas?
Excertos:
”- E o seu genro? Se o senhor não quer ser ministro de Estado, eu insisto para que o seu genro entre neste Governo”.
- Dá-me jeito. O tipo é um sorvedouro de dinheiro e a minha filha vai ficar contente.
- E pensar numa pasta para ele?
- Dá-lhe uma dessas pastas para imbecis. Sei lá, o Desporto, a Educação.
- Para a Educação estava a pensar no Fernandes. Não é estúpido mas é um grande mentiroso. E quando ao Desporto, não sei se é um bom futuro para a sua família.
- Não?
- Como os dirigentes que temos no futebol, precisamos de um ministro igual a eles para que se entendam. Alguém que seja analfabeto, suficientemente ordinário, que goste de contar anedotas, de almoçaradas, que arrote sonoramente e putanheiro. Para alem de tudo isto, é bom que se deixe corromper barato porque senão custa-nos uma fortuna!”
“- Uma espécie rara senhor almirante. Vive da treta, odeia o trabalho e vive da treta. Uma língua alcoolizada, uma imaginação prodigiosa, uma capacidade excepcional para a preguiça e, apesar de profundamente ignorante, fala todas as línguas que o engenho exija e disserta sobre qualquer assunto com mais convicção do que um acadêmico letrado.
- Está a falar dos portugueses.- Não. Estou a falar dos portugueses refinados. O verdadeiro chulo adora mulheres, sobretudo para lhe passarem a roupa e apertarem os cordões dos sapatos, anseia por uma boa briga, pela-se pela intrigalhada, embebeda-se diáriamente, nunca trabalha, aliás, odeia quem trabalha, e é o rei da inveja. A inveja é um pecado português, sabia?”
1 comentário:
Adorei este livro! Recordo-me de rir à gargalhada enquanto imaginava as situações (muitas vezes inconvenientes) do grande Leónidas!
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