Era uma vez um velho jornalista que, por ocasião dos seus 90 anos, pretende comemorar essa efeméride indo para a cama com uma virgem.
Homem vivido, tendo e até aos 40 anos tantas mulheres que lhe perdeu a conta na 5ª centena, mulheres a que sempre pagou para ter sexo, este homem pretende provar a si mesmo que, mesmo com esta idade, ainda aí está para as curvas, embora o seu aspecto não engane a idade que tem.
Contactando uma velha amiga dona de um bordel que ele muito frequentou, ele solicita uma virgem para essa noite de modo a satisfazer-lhe esse capricho. Curiosa a resposta dela: ”ai, meu sábio triste, desapareces vinte anos e só voltas para pedir impossíveis.”, a veia irónica de Marquez.
No entanto essa velha amiga lá lhe consegue arranjar uma jovem de 14 anos, combinando a hora e por onde ele deveria entrar sem ser visto no bordel.
Aí chegado, muito nervoso, depara-se com uma criança nua a dormir. Deita-se, também nu, junto da rapariga e acaba por adormecer.
A partir dessa noite uma estranha relação se inicia entre o personagem narrador e essa menina a quem ele chama de Delgadina, pois os encontros sucedem-se, mas nunca acontece nada. Ela está sempre a dormir e ele limita-se a acariciá-la e a adormecer ao pé dela. No entanto este estranho cenário tem o condão de fazer crescer nele afecto. Afecto que ele nunca sentiu por nenhuma mulher, limitava-se sempre a encontros sexuais. Neste caso, e com 90 anos, acaba por descobrir o amor.
Penso que Garcia Marquez tenta abordar duas questões:
A sensibilidade e sexualidade na velhice e, e isso foi o que me pareceu, uma outra perspectiva sobre a sexualidade na infância, ou se quisermos, uma perspectiva sobre o amadurecimento humano, até aonde vai a criança e onde começa o adulto. Atenção, pareceu-me. Penso mesmo que Marquez aflora a temática pedofília, no entanto e como eles nunca têm relações sexuais, não poderei afirmar que essa tenha sido a intenção dele. Assim, que sentido faz os dois principais personagens terem 90 anos e 14? Saliento que para além nunca haver nada entre eles, Delgadina encontra-se sempre em estado adormecido, ele apenas afaga, no entanto e perto do fim, é claro que o amor é reciproco.
Depois a sexualidade na velhice. O homem tem 90 anos, mas sente-se jovem por dentro. Aparentemente, e ele nunca é claro nesse sentido, o instrumento ainda funciona e mais, acaba de descobrir o amor.
Sei que o livro foi e será polémico e propício a várias interpretações. No entanto Marquez descreve algo que é muito normal em todo o mundo: desde sempre que os homens vão às “putas”, simplesmente para ter sexo, há então homens que a única forma de terem sexo é recorrer a essas mulheres.
Agora a relação com a menina de 14 é que me deixou pensativo sobre a intenção de Marquez, qual o objectivo dele?
É um conto bonito sobre o amor e a alegria de viver.
O narrador, sábio pela experiência de vida, desfila recordações da sua vida em diversas idades, tudo servindo para abarcar a possível evolução da sociedade corroída por preconceitos e vícios antigos. No entanto e é precisamente através dessas lembranças que o narrador se apercebe, embora conheça muito do mundo e das mulheres, que jamais conheceu o amor.
Sobre a escrita, enfim, Garcia Marquez não é dos meus escritores predilectos, mas tenho que admitir, ele escreve muito bem, há partes no texto que parecem poesia.
4 comentários:
Iceman !
Gabriel García Márquez é um dos meus escritores preferidos, sendo que "O Amor nos Tempos de Cólera" é um dos romances que mais gostei de ler até agora !
Curiosamente, "Memória das Minhas Putas Tristes" foi a primeira obra que li do escritor e, tal como nas restantes, retrata a velhice,a solidão e o amor.
Já li "Olhos de Cão Azul", uma colectânea de contos que me ofereceram. Não desgostei, embora não possa dizer que me marcou. Acho que é um autor que nos faz pensar (pelo menos esse livro fez-me pensar!) e que consegue escrever poeticamente. Mistura muito a fantasia com a realidade, tornando a descrição e toda a história um pouco surreal (isto a partir do livro que li). Até foi uma boa leitura, não deixo de aconselhar para os curiosos.
Até à data ainda não li nada da sua autoria, mas com o teu post, Iceman, estou muito interessado em ler...
O livro parece ser deveras interessante e pesquisei um pouco sobre ele (o autor) e as opiniões são todas positivas!
Mais um a ler! ;)
De GGM ainda só li "100 Anos de Solidão". Gostei, mas não é o livro da minha vida. Fiquei curiosa por outras obras do autor, mas entretanto outras leituras se vão sobrepondo... É o eterno problema!
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